Ativista que interrompeu primeiro-ministro para denunciar expansão do aeroporto de Lisboa ameaçado com dois anos de prisão. Grande ação de desobediência civil pela vida está marcada para 22 de maio no Aeroporto da Portela.
Foi na noite de 23 de abril de 2019: um grupo de jovens surpreendeu um discurso do primeiro-ministro para denunciar o crime da expansão do aeroporto da Portela e do novo aeroporto do Montijo. A culminar uma semana internacional de rebelião pela vida, aviões de papel esvoaçaram pela sala onde se celebrava o aniversário do Partido Socialista. Uma faixa denunciou “Mais aviões? Só a brincar! Precisamos dum plano B, não há planeta B”. O Kiko, ativista da campanha ATERRA, tentou tomar a palavra, até ser violentamente retirado pelos seguranças do primeiro-ministro.
Pela primeira vez, os media ecoaram a contestação ao maior crime atual contra as nossas vidas e o nosso futuro. Vivemos numa crise ecológica, perante a sexta extinção em massa, e a única forma de continuarmos a conjugar verbos no futuro é reduzir drasticamente a aviação.
Dois anos depois, o Kiko é contactado pelo Ministério Público. Curiosamente, não para agradecer pela denúncia do maior crime da atualidade, mas para o acusar de crime de desobediência qualificada. A pena pode ir até dois anos de prisão. Porquê? Por “perturbar a ordem e tranquilidade públicas”, uma vez que “não tinha comunicado a realização da manifestação à Câmara Municipal de Lisboa” (CML).
“Que eu saiba, a CML nunca me comunicou ou pediu autorização para, nos últimos 10 anos, duplicar o número de aviões que passam por cima da minha cabeça, arruinar a saúde das lisboetas, transformar a cidade numa Disneyland insustentável e comprometer a vida das gerações futuras. A VINCI, uma rede mafiosa multinacional, não foi acusada de perturbar a ordem e tranquilidade públicas ao querer destruir um dos mais importantes estuários da Europa e empurrar-nos a todas para o caos climático, para somar mais uns milhões”, denuncia Kiko.
O avião é de longe o mais poluidor e o mais elitista dos transportes – e também o que está mais livre de impostos. Ampliar aeroportos, enquanto se encerram comboios internacionais, é talvez a coisa mais estúpida e irresponsável que um político pode propor no século XXI. A ação de desobediência civil contribuiu para desmascarar o greenwashing da elite política e empresarial, que fala em descarbonização e decide aumentar 50% as emissões da aviação em Portugal.
Desde esse dia, ficámos a saber que o contributo da aviação para as alterações climáticas – o maior problema que a humanidade enfrenta – é três vezes maior do que estas admitiam. Milhares de estudantes, pais, sindicalistas e autarcas juntaram-se à denúncia do ecocídio do aeroporto do Montijo. A comunidade científica expôs problema atrás de problema e as associações ambientais colocaram o governo em tribunal. A Agência Portuguesa do Ambiente e o Instituto de Conservação da Natureza estão a ser investigados pela Polícia Judiciária.
A 22 de maio, no Aeroporto da Portela, terá lugar uma ação de desobediência civil em defesa da vida, para exigir menos aviões, uma transição justa e mais ferrovia. Antes, a 19 de abril, o protesto será em frente à sede do Partido Socialista, no Largo do Rato em Lisboa.
“Enquanto os discursos dos políticos ecoarem os interesses das elites, a desobediência seguirá sendo uma arma do povo. Alberto Martins, que estava a ser homenageado naquela noite, não pediu ‘autorização prévia’ para interromper Américo Tomaz. O 25 abril não foi comunicado à CML. Aqueles que julgam intimidar-nos não percebem o mundo em que vivem, não percebem que agimos segundo a nossa consciência e o nosso coração. Não estamos preocupadas com anos de prisão. Estamos preocupadas com a Vida. É a desobediência às leis da natureza que nos ameaça a todas“, afirma Kiko.
O julgamento está marcado para o dia 13 de janeiro de 2022 em Lisboa, a Capital Verde Europeia em 2020.
O cancelamento do projeto de aeroporto do Montijo e de expansão da Portela ainda não tem data marcada.
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