Crescem acusações de “desobediência” para reprimir defensores do ambiente. ATERRA participa em reunião com relator especial da ONU

Hans Eickoff e Francisco Pedro, da ATERRA, estiveram esta semana reunidos com o relator especial da ONU sobre os Defensores do Ambiente, Michel Forst, a convite da Amnistia Internacional Portugal e da Plataforma de Direitos Humanos, para abordar a repressão de ativistas ambientais em Portugal.

Também presentes no encontro estiveram ativistas da Greve Climática Estudantil (GCE) e da Climáximo, e o Guardião do Tejo Arlindo Marques.

Naquele que é um dos países da OCDE com menores níveis de participação civica, têm aumentado nos últimos anos as ações de perseguição e intimidação de ativistas por parte de empresas poluidoras, mas sobretudo por parte do próprio Estado. Em particular, as acusações pelo crime de “desobediência” têm sido uma forma de reprimir as pessoas que escolhem agir para defender a vida.

Francisco Pedro enfrenta a ameaça de uma pena até dois anos de prisão, após em 2019 ter participado numa ação de denúncia do crime da expansão do Aeroporto de Lisboa, durante um discurso do primeiro-ministro, António Costa. Foi acusado de desobediência qualificada, pelo suposto crime de não ter comunciado previamente a manifestação. O processo legal dura há 4 anos, depois de o Tribunal da Relação de Lisboa ter aceite o recurso do Ministerio Publico e revertido a decisão da juíza da primeira instância, que decidira pela absolvição do ativista pelo decrescimento da aviação.

Catarina, da GCE, lembrou que as e os estudantes estiveram aos milhares nas ruas e tudo o que receberam do poder político foi falsas promessas. Daí optarem por ações de desobediência civil.
Em maio de 2021, numa ação junto ao aeroporto de Lisboa por menos aviões, mais ferrovia e uma transição justa para os trabalhadores do setor da aviação, 26 pessoas foram detidas e ficaram até nove horas na esquadra para identificação, enquanto as mulheres foram obrigadas pela polícia a despir-se. Quatro estudantes que a 11 de novembro 2022 ocupavam a Faculdade de Letras de Lisboa de forma pacífica pela ação climática, foram condenadas a pagar multas de 300 euros por desobediência.

Uma ativista da GCE, que no passado dia 15 de setembro filmava uma manifestação, foi algemada e detida por um agente da PSP à civil, e foi depois condenada a uma multa de 250 euros e ameaçada pelo juiz de que numa próxima vez seria presa.

Segundo Sinan, do Climáximo, os agentes da polícia têm atualmente instruções claras para impedir ativistas e jornalistas de filmar e fotografar o que se passa nos protestos. O ativista falava desde a esquadra de Benfica, onde estava em solidariedade com 9 ativistas detidas após cortarem o trânsito da Segunda Circular para denunciar a responsabilidade do governos e das empresas na crise climática.

“Hoje nenhuma dirigente de uma grande empresa foi preso por ecocídio, mas nove ativistas estao aqui na esquadra”. Lembrou que as forças policiais, que incluem 6 mil militantes de extrema direita, e o próprio sistema judicial fazem parte do sistema que está a destruir a vida, e apelou a solidariedade com todas as ativistas.

Arlindo Marques, que vem denunciando a poluição do rio Tejo pelas empresas de celulose e outras poluidoras, partilhou sobre as várias ações de intimidação – e mesmo uma tentativa de homicídio – de que foi alvo, por estas empresas. A Celtejo, da multinacional Altri, chegou a exigir-lhe 250 000 € por difamação. Intimidar defensoras de direitos humanos e da Terra através de processos legais é uma prática comum por parte de grandes empresas, conhecida por SLAPP, procurando silenciar as ativistas enquanto se arrasta o processo.

Em Portugal, o Estado faz cada vez mais as vezes de empresa privada. A figura da “desobediência” vem sendo abusada pela legislação e pelas forças policiais.

Michel Forst diz-se surpreendido pela violência e pelas diferentes formas com que os governos em vários países estão a atacar ativistas.

Sublinhou que “quem defende o meio ambiente é um defensor humanista” e que “a repressão dos ativistas climáticos é uma questão de direitos humanos”, uma vez que a repressão que sofrem tem um efeito dissuasor na sociedade.

“Os juízes não percebem as obrigações que têm. Estamos a trazer-lhes a informação do que é a desobediência civil e o que a lei internacional diz: pessoas que desobedecem à lei para fazer uma ação pública, um protesto não violento.”

“A tripla emergência ambiental das alterações climáticas, poluição e perda de biodiversidade é uma das questões mais prementes que as sociedades em todo o mundo precisam de enfrentar”.

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